Sabe, em janeiro desse ano eu fui pra um acampamento, o NR, e sabe, lá eu senti de tudo, inclusive as tais borboletas.. Pois, elas não aparecem só quando você está apaixonado ou afim de alguém, e sim, quando está em um momento especial, com saudade de alguém e tudo mais.. (Leia ali em cima ou o primeiro post para saber mais rs)
E sabe, tudo o que eu vivenciei lá foi mais que incrível, e agora, escrevendo carta para um amigo que conheci lá, me fez relembrar de tudo, de todos os momentos incríveis, das pessoas, dos lugares, das emoções..
Pois, por mais que você queria sentir tudo isso de novo, você sabe que será impossível, afinal, como fazer pra juntar de novo todas as mesmas pessoas que foram, e sem contar que, como eu, que fui de penetra na formatura da oitava, sendo que eu estava no primeiro, rs.. Se torna basicamente impossível. Mas mesmo assim, é incrivelmente incrível pensar nas possibilidades de retornar com eles algum dia..
Por mais que tudo que eu tenha passado lá tenha sido incrível, as brincadeiras, os momentos livres, as pessoas incríveis, os momentos mágicos, a simplicidade das pessoas, o quão mágico era acordar e ir na sacada e cantar ao som de qualquer música especial e ter aquela bela visão só pra você, com a mais pura magia.. Acho que o mais perfeito de tudo e mais especial foi o Fogo do Conselho, em que reúnem todos os acampantes no salão, acendem a lareira e um dos monitores conta-nos uma história incrível, que necessita de tamanha imaginação, então, aos que lerem peço que usem sua imaginação..
"Havia uma vez... Melhor dizendo, era uma vez uma aldeia em cima
de uma montanha que ficava situada na... bem, ficava mais ou
menos situada onde sua imaginação alcançar. É essa pequena
aldeia que eu, daqui de cima, escolhi para esta fábula onde..."Era uma vez uma cidade chamada Felicidade. Felicidade era um lugar lindo, desses em que qualquer um de nós gostaria de morar. Não tinha o rico, nem o pobre. Não tinha a mansão, nem tinha a favela. Os carros não buzinavam. As pessoas não brigavam. Pelo contrário, conversavam animadamente nas ruas, que aliás não tinham lixo nem fediam, e as paredes, quando não estavam lisas, era porque tinham bonitos desenhos. Por onde se passava, seja nas ruas, nas praças ou nos bosques, sempre via-se crianças brincando, casais namorando, alguém jogando conversa fora. Em todas as casas, as janelas não tinham grades, e as portas estavam sempre abertas.
Os habitantes de Felicidade tinham um hábito curioso. Eles trocavam pedaços de algodão sempre que se encontravam. Seja no trabalho, nas horas de lazer, no colégio, não importa. Você sempre dava um pedaço de algodão para quem cruzasse no caminho, e recebia outro da pessoa. Em Felicidade, o algodão representava o carinho que as pessoas sentiam umas pelas outras. Porque o algodão é fofo, macio, gostoso de passar a mão, gostoso de apertar com os dedos. Um objeto simples e singelo, mas ideal para representar o carinho que as pessoas de fato trocavam quando o algodão passava de mão em mão.
Como toda história, a nossa tem o seu protagonista. Um garoto chamado Joãozinho. Era um garoto comum de Felicidade, com uma rotina comum. Ele acordava, trocava algodão com os pais. Ia pra escola, aprendia coisas novas, e depois ia brincar. Sempre trocando pedaços de algodão com quem encontrava: os colegas de rua, os professores, os colegas de sala, os colegas das outras salas. Como muitos de nós, Joãozinho tinha seu fiel escudeiro, seu grande camarada, seu melhor amigo. Um garoto chamado Pedrinho, tão comum quanto Joãozinho. Os dois eram típicos amigos inseparáveis. Se conheciam desde muito pequenos e faziam praticamente tudo juntos: estudar, jogar bola, andar por aí, tudo. Nunca tinham brigado, durante toda a vida, por qualquer motivo que fosse. Todos em Felicidade reconheciam e admiravam aquela amizade.
Uma particularidade de Joãozinho, todos em Felicidade sabiam, era um brilho especial que tinha no olhar, um tanto diferente dos olhares das outras crianças da cidade. Certo dia, Joãozinho, Pedrinho, e outras pessoas da turma estavam jogando futebol no gramado da região. Felicidade tinha um gramado lindo, um tanto afastado das casas e ruas, que era o lugar preferido de muitas pessoas para jogar bola, namorar, conversar, olhar as estrelas à noite... Nesse dia a bola, como é comum acontecer, em certo momento foi chutada para longe, e Joãozinho foi lá buscar. Quando pegou a bola e se levantou, Joãozinho viu uma velhinha, visivelmente nova na cidade. Primeiro porque Joãozinho já havia trocado na vida algodões o suficiente para conhecer todas as pessoas de Felicidade. E segundo porque a senhora estava com aspecto abatido, triste, com roupas sujas... era notável que ela não era dali. Então Joãozinho tirou um pedaço de algodão do bolso, estendeu para a velhinha e disse:
— Olha, minha senhora, eu não a conheço, mas percebo que você não é daqui, e que precisa de muito carinho. Isto é o meu carinho, pega. Troca ele com as outras pessoas na cidade. Tenho certeza de que, em pouco tempo, você terá tão carinho e será tão querida quanto todos nós.
Ao que a velhinha respondeu:
— Eu não quero o seu carinho, Joãozinho.
O menino, claro, se assustou. Nunca ninguém em Felicidade recusava um algodão. Mesmo que fosse para receber um e dar dois, as pessoas sempre aceitavam, porque era sempre bom receber carinho de alguém. Enquanto ele ainda estava digerindo o que acabara de ouvir, a senhora explicou:
— Eu não quero o seu carinho, Joãozinho, porque eu quero que você guarde ele para si. Eu vim lhe dar um conselho. Eu reparei que você tem um brilho no olhar diferente dos outros meninos da cidade. Você quer sair de Felicidade, certo, Joãozinho?
Era verdade, não havia como negar. Joãozinho amava Felicidade com todas as forças, era o lar dele, o cantinho dele. Mas ele queria conhecer o que havia lá fora. As outras cidades, as montanhas, os vales, os rios, outras culturas, músicas, literaturas. Joãozinho queria crescer nesse aspecto, embora tivesse um afeto muito grande por sua terra natal. A velhinha continuou:
— O conselho que eu vim lhe dar, Joãozinho, é o seguinte. Daqui para frente, toda vez que você receber um carinho, não troca ele não. Guarda. Guarda pra você. Carinho é poder. Se você tiver muito, mas muito carinho, em algum tempo será a pessoa mais querida daqui, e poderá esse poder em seu favor, para fazer as viagens que quer. Para realizar seu sonho.
Depois dessas palavras, a velhinha se virou e foi embora. Joãozinho nunca mais a viu. Ele voltou para o seu futebol com a turma, um tanto desconcertado com aquilo. Afinal, era informação demais, ele ainda mal podia acreditar que vira uma pessoa recusar um algodão. E que idéia estranha essa, guardar carinhos. Joãozinho gostava de estendê-los às outras pessoas, tanto quanto gostava de receber. Ele continuou jogando a sua bola normalmente, e o resto do dia não teve maiores novidades. Mas por mais estranha que a idéia parecesse, ela continuou martelando na cabeça do garoto, como um prego que se recusa a furar a madeira. No dia seguinte, ao acordar, decidiu seguir à risca a sugestão da senhora, e começou a guardar algodão o tempo inteiro, para poder deixar Felicidade um dia.
O tempo foi passando, Joãozinho foi crescendo, chegou na adolescência. A cada dia que passava, Joãozinho acumulava mais e mais pedaços de algodão com uma rapidez surpreendente. Em pouco tempo, era em toda a cidade quem mais possuía algodão. Nem pensava mais em trocar. Quando encontrava com alguém e recebia o carinho, ele simplesmente agradecia sorrindo, colocava o carinho no bolso, e esperava chegar em casa para guardá-lo junto aos outros. E a cada dia que passava, Joãozinho ficava mais egoísta e mais fechado, completamente diferente do garoto gentil e extrovertido que havia sido. Para que sair de Felicidade, se ficando ali ele podia sempre ganhar mais e mais algodão? Conforme ia se tornando querido, seu temperamento ficava cada vez pior. Seu comportamento mudou, e depois de um tempo, Joãozinho havia se tornado uma pessoa extremamente insuportável.
Os pais sem dúvida notaram as mudanças na personalidade do filho. Mas não imaginaram o que seria, e acharam que tocar no assunto só iria piorar as coisas. Era uma fase, pensavam. A namorada terminou com ele, brigou com a turma... Enfim, algo normal da adolescência que, como fase, com certeza passaria, era só esperar. Pedrinho, claro, também notou que seu grande parceiro estava diferente. Mas, ao contrário dos pais, não pensou que era uma fase. Preocupado, foi até a casa dele para conversar, e os pais disseram que Joãozinho estava tomando banho. Pedrinho resolveu esperar no quarto, e decidiu procurar ali algo que indicasse o que havia acontecido com seu amigo. Afinal, Joãozinho sempre lhe dera total liberdade dentro daquele quarto. Abriu as gavetas da mesinha de cabeceira, nada. Olhou debaixo da cama, nada. Já tinha procurado em quase todos os lugares quando abriu a parte de cima do guarda-roupas, aquelas portinhas superiores onde se guarda lençóis de cama e malas de viagem. Foi então que bolos e mais bolos gigantes de algodão caíram sobre sua cabeça. Era inacreditável o tamanho e quantidade daqueles amontoados de carinho, Pedrinho ficou absolutamente soterrado. Enquanto ele estava refletindo qual relação aquilo poderia ter com as mudanças em seu amigo, Joãozinho entrou no quarto. Sem hesitar, deu uma bronca violenta em Pedrinho.
— O que você está fazendo aqui?! O que você está fazendo com o meu algodão?! O meu carinho?! O meu poder?! Vai embora! Eu não te quero mais aqui, neste quarto, nesta casa, na minha vida! Eu não quero mais ser seu amigo! Anda logo, vai embora, e deixa o meu carinho em paz!
Mesmo completamente assustado, Pedrinho respeitou o desejo do amigo, e saiu. Como bom amigo que era, ele decidiu procurar Joãozinho na escola no dia seguinte para conversarem e explicarem as coisas. Tinha certeza, ora bolas, de que Joãozinho faria exatamente o mesmo por ele. Joãozinho, que então estava mais calmo e seguro de que todo o seu algodão estava a salvo, contou para Pedrinho:
— Olha, eu vou te contar, mas é só porque você é o meu melhor amigo. Teve um dia em que eu decidi não trocar mais pedaços de algodão, e sim só receber e guardar. Graças a isso, você pode reparar, eu sou hoje a pessoa mais querida e poderosa de toda a cidade. No seu lugar, eu fazia o mesmo. Eu também quero que você tenha carinho, que você tenha poder.
Apesar de Joãozinho não ter reparado, alguém entreouviu a conversa. A notícia se espalhou. Que genial, guardar pedaços de algodão. Era por isso que Joãozinho era tão querido, porque ninguém pensara nisso antes? E então, conforme o tempo passava, a cidade ficava diferente do que Joãozinho conhecera na infância. Ele, claro, não notou, estava preocupado demais em acumular cada vez mais carinho. Certo dia, Joãozinho decidiu ir embora. Resolveu que não estava mais a fim de ficar em Felicidade, que era chegada a hora de realizar seu sonho de conhecer o mundo. E foi. Não avisou aos pais, sequer se despediu de seu melhor amigo. Simplesmente pegou suas coisas e saiu.
Lá fora, ele se tornou de imediato uma pessoa extremamente respeitada. Não mais Joãozinho, Doutor João só poderia ser alguém muito poderoso, se trazia provas de que era tão querido assim no lugar de onde vinha. Comprou uma casa enorme e viveu uma vida farta. A única coisa que o incomodava a essa altura era a hora de dormir. Desde que abandonara Felicidade, João tinha pesadelos. Ele não sabia ao menos o motivo de serem pesadelos, pois tudo o que conseguia ver era uma névoa muito densa, e tudo o que conseguia ouvir eram sons abafados e indistintos. Mesmo assim, todas as manhãs João acordava muito assustado, e com o coração batendo muito forte. A cada noite que passava, o pesadelo se tornava menos nebuloso. Algum som se tornava um pouco mais nítido, alguma paisagem se tornava um pouco mais visível. Até a noite em que conseguiu entender o sonho, e compreender o motivo se ele ser tão assustador. João sonhava com sua cidade natal, Felicidade. Porém completamente diferente do que ele lembrava. Quando acordou daquela vez, João não pensou duas vezes, e foi voando para casa.
Ao chegar na cidade, se deparou exatamente com o que se deparava todas as noites ao dormir. Felicidade não parecia nada com o recanto de infância de Joãozinho. A inimizade, a divisão entre as pessoas era surreal. Os poucos que davam bom-dia agora o faziam por mera regra de etiqueta, ou por desejo de ascensão. João olhou à volta. Pequenos furtos aconteciam o tempo inteiro diante de seus olhos, sem a vítima nunca se dar conta. Mendigos em um canto se esbofeteavam por um pedaço de pão mofado. No semáforo, outros tantos pediam esmola como se daquilo dependesse a vida. As calçadas estavam imundas, ninguém mais ligava se a rua ficava suja. Pouquíssimas pessoas andavam sorridentes em seus carros caros em direção a suas mansões, e esse sorriso era rapidamente quebrado por qualquer coisa que fosse motivo para buzinar. Buzinas eram ouvidas o tempo inteiro em cada canto. Rabiscos ininteligíveis cobriam todas as paredes, que fediam a mijo. Todas as portas estavam trancadas. Todas as janelas estavam cobertas de grades de uma ponta à outra da cidade. Simplesmente não havia, por mais que se procurasse, um único habitante dando um pedaço de algodão para outro.
Foi então que João compreendeu tudo. Desesperado com aquela cena, correu para a própria casa, e precisou usar a chave pela primeira vez. Encontrou a mãe um tanto mal vestida e abatida. Estava sozinha, o pai estava em algum lugar lá fora dando duro pra manter os dois alimentados até de noite. Completamente aos prantos, Joãozinho disse:
— Desculpa, mãe. Desculpa. Eu sei que a culpa é minha. Eu não queria, não era para nada disso acontecer.
E é claro que ela desculpou. Como poderia não desculpar? Estava orgulhosa do filho, que reconhecera o próprio erro. Enquanto isso, Pedrinho vinha andando pela rua e estranhou a porta que Joãozinho deixara escancarada. O que uma porta estava fazendo assim aberta ao léu em Felicidade, os donos não sabiam que era perigoso? Foi então que Pedrinho reconheceu a casa e entendeu. E entrou. Ao olhar para trás e ver seu amigo entrando, Joãozinho imediatamente correu para lhe dar um abraço. Não queria nem saber, precisava dar um abraço em Pedrinho. Chorou como nunca na vida. Abraçou Pedrinho como nunca na vida. Nada naquele momento poderia lhe dar mais satisfação do que ver o velho companheiro. Não soube por quanto tempo ficaram abraçados, nem fez questão de saber. Joãozinho apenas queria poder abraçar seu amigo para chorar, demorasse o quanto demorasse. E abraçou, e chorou, e demorou quanto tempo foi necessário. Pedrinho não moveu um músculo para apressar aquele abraço.
Quando finalmente se soltaram, Joãozinho deu um discurso muito parecido com o que fez para a mãe:
— Porra, cara, desculpa. Desculpa mesmo, sério. Eu não queria. Não queria de verdade. Foi sem querer. Não era para nada disso ter acontecido. Me perdoa.
E é claro que Pedrinho perdoôu. Amava o amigo e não escondia isso de ninguém. Nunca haviam brigado, nunca, e ele não deixaria aquela ser a primeira vez.
Foi então que Pedrinho teve uma idéia. Contou a Joãozinho, que gostou e concordou na mesma hora. Os dois botaram imediatamente em prática. Colocaram todo o algodão que Joãozinho acumulou a vida inteira no carro, lotaram a mala e o banco de trás. Se algodão não fosse tão fácil de amassar, não caberia. E saíram pela cidade. Foram em todos os lugares distribuir aquele algodão, foram atrás de todas as pessoas, uma a uma. Não esqueceram de nenhuma rua, de nenhuma casa. Passaram em todos os semáforos e esquinas e deram um pedaço de algodão a todos os mendigos. Foram no bairro nobre da cidade e entraram em todas as mansões para dar algodão aos donos. Passaram o dia inteiro se dedicando a que não houvesse nenhuma pessoa com quem não encontrassem. O algodão estava quase no fim, os endereços que faltavam eram poucos, quando as primeiras pessoas com quem encontraram naquele dia foram até eles. E essas pessoas lhe deram um pedaço de algodão, e receberam outro. E quando a última pessoa foi encontrada, não havia mais como acabar o algodão, porque sempre alguém por quem passavam lhes dava um pedaço.
E a vida seguiu, Joãozinho e Pedrinho nunca conseguiram acabar aquele algodão. Com o tempo, todas as ruas foram sendo limpas. As grades nas janelas e trancas nas portas perderam a necessidade, e deixaram de existir. As crianças voltaram a brincar nas praças, os casais voltaram a namorar e olhar estrelas no gramado distante. As buzinas não eram mais ouvidas, foram completamente substituídas pelas mesmas conversas animadas de outrora. A distância social entre as pessoas foi se reduzindo a zero, até não haver mais qualquer rico ou qualquer pobre. Os desenhos bonitos voltaram a preencher os muros. Felicidade foi lentamente voltando a ser como era, e as pessoas voltaram a trocar carinhos.
Sinceramente, achei essa a parte mais incrível do acampamento e, ao menos nem sei se felicidade existe, mas sei que tudo isso é real, essa coisa de felicidade e tudo mais. Me encanta saber o quanto a palavra amigo é significativa e me dói saber que muitos não sabem diferenciá-la de colega. E sabem, pra vocês terem uma idéia, no começo do Fogo do Conselho, eles distribuem um algodão pra cada e um, e após o término da história, nos dizem que está é a oportunidade de nós dizermos sem medo 'eu te amo' com sinceridade para alguém..
Tudo aquilo foi mais que incrível, foi mágico, sem dúvidas..
Espero que eu tenha conseguido passar um pouco do que eu senti aqui. E agora, no próximo post, irei postar a música que eles tocaram após tudo isso, que, se lerem a letra pensando em tudo isso que postei agora, irão entender o sentido de tudo..